Água que sobe e desce a montanha
Às vezes sou um rio que jorra da montanha
e corre tormentosa em direção ao cume,
num caudal de sede nunca satisfeito
que despreza a gravidade das pedras e dos bichos.
Os lobos galopam nas margens indecisas,
saltam para o dorso líquido e farejam
os aromas selvagens que a terra dispersa.
A água trepa pelas encostas,
estende-se como pontes sobre os desfiladeiros,
destrói os obstáculos que a enfrentam
muda de rumo quando lhe apetece
e chegada ao cume,
à cratera faminta,
lança-se nas profundezas do vulcão eterno
para revigorar-se e eclodir de novo.
Às vezes sou a água que nasce da montanha
e flui pelas encostas num caminho de luz,
repousando em clareiras, à espera de planícies
— onde tudo é visível, constante e seguro,
e os dons da harmonia afugentam as feras.
A morte dilui-se no perfume das flores.
A névoa da orla esconde a floresta.
Os lobos são sorrisos com chilreios de pássaros.
Todos os seres se concentram na água
e o brilho dos seus olhos forma um espelho sereno
onde eles contemplam as suas aparências.